
LUIZ HUMBERTO MONTEIRO PEREIRA
AutoMotrix
A última década não deixou boas lembranças para a Peugeot no mercado brasileiro. Em 2010, obteve 90.307 emplacamentos e fechou o ano na nona posição no ranking nacional de marcas. Uma década depois, após fraco 2019, quando vendeu 21.613 unidades que lhe renderam a 13ª posição no ranking, a marca francesa encerrou 2020 como uma das mais atingidas pela pandemia do novo coronavírus. Acumulou apenas 13.467 emplacamentos e caiu para o 14º lugar. Nesse contexto, o lançamento do novo 208, ocorrido em setembro, é parte fundamental da estratégia da Peugeot para tentar voltar ao “top 10” nacional.
Em novembro e dezembro, as vendas do renovado compacto se mantiveram próximas de 1.100 unidades mensais – um terço da média de 3,3 mil unidades mensais emplacadas pelo seu antecessor 207 naquele distante ano de 2010. Porém, o mais novo Peugeot já vende cinco vezes mais que a geração anterior do 208 vendia antes da pandemia e supera os emplacamentos dos demais modelos da marca somados – os crossovers 2008, 3008 e 5008 e os furgões Expert, Boxer e Partner.
A linha 2021 do 208 vendido no Brasil é produzida em El Palomar, na Argentina. A fábrica de Porto Real (RJ), onde era feita a geração anterior, deverá ser destinada ao futuro utilitário esportivo 1008 e a modelos da Citroën. A carroceria do novo 208 é sutilmente mais longa, mais larga e mais baixa que a de seu antecessor. A dianteira exibe elementos da nova assinatura visual da Peugeot na parte inferior – lá está o “olhar felino” expresso nos faróis e no “dente de sabre” formado pela iluminação diurna full-LED. A ampla grade ostenta o indefectível logotipo do leão boxeador ao centro.
A traseira evoca as dos utilitários esportivos 3008 e 5008. Nela, o acabamento em black piano se estende por toda a largura da tampa do porta-malas, como uma “ponte” unindo as lanternas dotadas de elementos luminosos que insinuam três garras.
O primeiro i-Cockpit – com seu volante pequeno e painel de instrumentos elevado – surgiu juntamente com o primeiro 208, no início de 2012. Alastrou-se por toda a linha Peugeot e tornou-se símbolo da marca. O atual 208 incorpora a nova geração do i-Cockpit, batizada como i-Cockpit 3D, que adiciona um mostrador digital em três dimensões ao ambiente dominado pelo volante Sport Drive. No novo visor, algumas informações aparecem projetadas em destaque, mais à frente. A central multimídia touchscreen tem tela de sete polegadas.
A linha 2021 do 208 marca a estreia da produção de hatches na plataforma CMP (Common Modular Platform), uma das mais modernas do Grupo PSA. A arquitetura permite a introdução de inovações tecnológicas de assistência à direção, segurança e de comodidade do Peugeot Driver Assist – todas exclusivas da versão Griffe. A configuração top de linha do 208 traz de série sistemas como alerta de colisão, frenagem de emergência, alerta e correção de mudança de faixa, auxílio de farol alto, reconhecimento de placas e de limite de velocidade exibido no painel de instrumentos e carregamento sem fio de smartphone.
O 208 Griffe incorpora ainda requintes como teto de vidro panorâmico, rodas de liga leve de 16 polegadas diamantadas, ar-condicionado automático digital, volante multifuncional em couro, bancos em Alcântara, chave keyless, partida do motor por botão e assistente de estacionamento VisioPark de 180º. Um pacote amplo, que ajuda a justificar os salgados R$ 96.990 cobrados pelo 208 Griffe.
Porém, nem tudo inspira modernidade no novo 208. Todas as versões são movidas pelo motor 1.6 16V flex da mesma família do 1.6 8V dos primeiros 206 nacionais, lançados há 20 anos. O propulsor atua associado à transmissão automática sequencial de seis marchas e, com etanol, desenvolve 118 cavalos de potência e 15,5 kgfm de torque.
Embora seja mais antigo, o 1.6 16V oferece mais potência e torque do que o 1.2 Puretech aspirado bicombustível que movia a versão anterior produzida até o primeiro semestre do ano passado em Porto Real, que entregava 84 cv e 12,2 kgfm na gasolina e 90 cv e 13 kgfm no etanol. Todavia, quem acompanhou o lançamento do 208 na Europa esperava que o novo carro viesse para o Brasil com o moderno propulsor da versão europeia, um 1.2 turbo com até 130 cv de potência e 20,4 kgfm de torque.
A opção da Peugeot por equipar o novo 208 com um motor de concepção antiga resulta em um “efeito colateral” explicitado na avaliação de consumo e emissões do Inmetro, afixada no para-brisa do carro. Nela, aparece a informação de que o modelo recebeu um conceito “D” na categoria de hatches compactos, na escala de “A” até “E”. O selo do Programa Brasileiro de Etiquetagem atesta que o consumo do 208 flex na cidade fica em 7,5 km/l com etanol e em 10,9 km/l com gasolina. Na estrada, os consumos aferidos foram de 9 km/l com etanol e de 13,1 km/l com gasolina.
Motor veterano contrasta com expectativa de comportamento insinuante
O Peugeot 208 Griffe apresenta curioso paradoxo. Sua estética externa e interna, a modernidade da plataforma e as tecnologias embarcadas sugerem comportamento dinâmico instigante, mas o veterano motor 1.6 16V flex não corresponde à esportividade insinuada. Até oferece torque e potência coerentes com um compacto urbano, mas o visual do novo 208 inspira algo além disso.
Para quem gosta de dirigir de forma mais dinâmica, o compacto da Peugeot demora mais que o desejável para reagir às pressões no pedal do acelerador, que tem curso um tanto longo. O câmbio automático de seis velocidades cumpre sua função e faz as passagens de marcha de forma elegante, sem solavancos, mas também não foi desenvolvido para tornar as performances mais arrebatadoras.
O uso do modo Sport do câmbio ou o acionamento manual sequencial das marchas na manopla até permitem retomadas um pouco mais vigorosas, mas nada demasiadamente emocionante. O modo Eco, voltado para a economia de combustível, deixa o compacto ainda mais comedido.
Porém, a contradição entre a estética e a mecânica está longe de ser uma exclusividade do modelo da Peugeot. Como muitos consumidores fascinados pelo design esportivo não costumam pisar demais no acelerador, modelos visualmente instigantes como o 208 cumprem seu papel de inspirar o imaginário.
Se o hatch não oferece desempenho tão empolgante quanto seu estilo promete, a dirigibilidade do novo Peugeot é um dos seus destaques. O sistema de suspensão filtra as irregularidades do piso com eficiência. A direção elétrica cumpre bem seu papel e oferece boa comunicação entre o motorista e as rodas.
A BORDO
O i-Cockpit 3D do Peugeot 208, com seu volante reduzido com a base e o topo achatados, permite boa visualização das informações dos instrumentos e sugestiona posição de dirigir que faz o motorista se sentir como um piloto. As informações apresentadas de forma tridimensional, projetadas em diferentes “profundidades”, facilitam a visualização e dão um toque futurista ao ambiente. Graças à tecnologia holográfica em 3D, algumas informações aparecem em destaque, aproximando-se dos olhos e proporcionando leitura mais confortável.
Outras tecnologias do 208 top de linha reforçam o aspecto futurista. O painel de instrumentos exibe as placas de trânsito e de limites de velocidade, mas nem todas são captadas pelo sistema. O carregamento sem fim de smartphones também ajuda a criar um ambiente de modernidade, assim como o assistente de estacionamento VisioPark 180º.
O teto de vidro panorâmico amplia a percepção de espaço a bordo, enquanto o requinte da versão Griffe é ressaltado por itens como ar-condicionado automático digital, volante multifuncional em couro, bancos em Alcântara, chave presencial com comandos de abertura das portas e da tampa do compartimento de carga e partida do motor por botão. No geral, o acabamento interno é de padrão elevado – o dos para-sóis, um tanto tosco, é uma rara exceção.