LUIZ HUMBERTO MONTEIRO PEREIRA
AutoMotrix
Nem todo mundo está satisfeito com aquilo que é – e esse inconformismo também atinge os automóveis. Há subcompactos urbanos que se apresentam como off-roads, sedãs com cara de cupês e até hatches pacatos “travestidos” no estilo hot rod. Entre as picapes médias, a tendência atual é se posicionar como “SUV com caçamba”. Aqueles veículos rústicos similares a pequenos caminhões, usados para transporte de mercadorias, tornaram-se modelos confortáveis e tecnológicos, espelhando-se cada vez mais nos utilitários esportivos, que formam o segmento do mercado automotivo com o maior crescimento no Brasil e no mundo.
Na briga das picapes médias, o subsegmento mais movimentado em termos de lançamentos é o das versões mais requintadas, que têm como alvo preferencial a elite do agronegócio brasileiro – os grandes empresários rurais que buscam um veículo para aguentar os rigores dos “caminhos da roça”, sem abrir mão do conforto. É para esse tipo de consumidor abonado que a GM desenvolveu a versão “western” High Country de sua S10.
Na remodelação de julho do ano passado da linha S10, a versão High Country ganhou diferenciais mais ostensivos para reforçar o aspecto de exclusividade. A grade é escura e traz o nome “Chevrolet” em relevo sobre uma barra central – lembra a da Silverado vendida no mercado norte-americano. O logo da clássica gravatinha dourada deixou de ser centralizado e passou a aparecer à esquerda, sobre uma trama tipo colmeia emoldurada pelos faróis com LEDs. O para-choque redesenhado, com aplique central e moldura na parte inferior, ajudou a ampliar o ângulo de ataque de 27º para 29º. Os faróis auxiliares ganharam posição mais elevada.
Foram preservados itens como as rodas de alumínio de 18 polegadas diamantadas, as maçanetas das portas e da tampa da caçamba cromadas, o santoantônio com design exclusivo, a capota marítima e o logotipo da versão na tampa da caçamba com 1.329 litros de capacidade. Internamente, o estilo é reforçado por bancos e o volante revestidos em couro marrom, pelos emblemas “High Country” nas portas dianteiras e por detalhes de acabamento cromados.
Em termos de segurança, a S10 High Country traz airbags frontais, laterais e de cortina, alertas de colisão frontal e de saída de faixa, assistente de partida em rampas, alerta de pressão dos pneus e controle de velocidade em declives. Desde a remodelação do ano passado, a versão top de linha da S10 incorpora de série o sistema de frenagem autônoma de emergência, que é capaz de pará-la automaticamente entre 8 km/h e 80 km/h ao identificar situação de risco envolvendo obstáculo à frente.
Entre os equipamentos voltados ao conforto estão banco do motorista com ajustes elétricos, acendimento automático dos faróis, ar-condicionado eletrônico, coluna de direção com ajuste de altura, chave tipo canivete, direção elétrica progressiva, espelhos externos com rebatimento elétrico, sensores de estacionamento dianteiros e traseiros, partida remota do motor pela chave e vidros elétricos com sistema “um toque”.
A conexão 4G Wi-Fi nativa é paga (e gera mensalidade) e o sistema multimídia MyLink tem tela sensível ao toque de oito polegadas com navegador GPS integrado e conectividade para Android Auto e Apple CarPlay.
Sob o capô, a S10 High Country traz o mesmo motor 2.8 turbodiesel de quatro cilindros adotado nas versões LT e LTZ e no SUV Trailblazer, com turbocompressor de geometria variável, intercooler e injeção direta de combustível. No ano passado, ganhou recalibração e novo turbo para melhorar o desempenho, mas manteve os 200 cv de potência a 3.600 rpm e 51 kgfm de torque, a partir de 2 mil rpm. Na High Country, atua acoplado ao câmbio automático de seis marchas com modo manual Active Select (com trocas pela alavanca). A tração pode ser frontal, 4×4 ou 4×4 com reduzida.
A configuração High Country da picape S10 é oferecida por R$ 244.930 (o preço pode variar de acordo com a cor da carroceria), sem opcionais. A versão deve permanecer como a picape top de linha da GM até a chegada da grandalhona Silverado, adiada pela falta global de semicondutores – mesmo problema que levou a fábrica da S10 em São José dos Campos (SP) a passar longo período em turno único. A normalização do ritmo de produção ajudará a retomar a briga com a Toyota Hilux e a Ford Ranger pela liderança do segmento.
Bruta, mas civilizada
O porte é similar ao de um pequeno caminhão – são quase 5,5 metros de comprimento e 1,85 m de altura. O peso ultrapassa com folga duas toneladas. Porém, para quem dirige, a S10 High Country nem parece tão grande nem tão pesada assim. Embora apresente som e trepidação característicos dos motores a diesel, o 2.8 turbodiesel se harmoniza bem com a caixa automática de seis marchas. Juntos, fazem o correto gerenciamento da força necessária para mover a picape. As passagens de marcha são suaves, sem maiores solavancos. Nas manobras em ritmo mais lento, a direção elétrica facilita a interatividade com as rodas.
No trânsito urbano, o acerto da suspensão é correto e privilegia o conforto. Pelo porte do veículo, nas frenagens, é prudente reservar bom espaço para chegar à imobilidade. Nas estradas, a oscilação da carroceria é discreta, resultado dos 25 anos de evolução da S10, que reduziram problema recorrente nas picapes médias, sobretudo quando sem carga.
Em rodovias, quando a S10 atinge velocidades mais elevadas, o câmbio automático sabe aproveitar o torque farto do motor. Há discreto “delay” na reação do propulsor quando o motorista pressiona o acelerador, mas nada que incomode. O ganho de velocidade é gradual, mas a S10 High Country mantém velocidades de cruzeiro sem aparentar esforço.
Quando detectam situações de iminente perda de controle da direção, os sistemas eletrônicos acionam automaticamente os freios nas rodas adequadas para ajudar a reposicionar o veículo.
Embora encarar trilhas não seja a rotina esperada para uma picape de mais de R$ 250 mil, quando solicitada, a High Country mostra que tem capacitação para o off-road. Encara trechos esburacados, alagamentos, subidas íngremes ou pisos de baixa aderência com boa desenvoltura graças à tração 4×4, acionável pelo botão no console central. Em trilhas mais complicadas, a opção de tração integral reduzida com bloqueio de diferencial ajuda a tirá-la de qualquer encrenca. Junto com os 22,8 cm de vão livre do solo, os pneus de uso misto 265/60 R18 também colaboram bastante.
A S10 High Country recebe bem motorista e passageiros em seus confortáveis bancos em couro. O do motorista com ajustes elétricos facilita a tarefa de encontrar a posição de dirigir. Como a picape tem assoalho traseiro quase plano, quem viaja ali encontra bom espaço para pernas e pés.
O multimídia com tela de oito polegadas sensível ao toque tem GPS integrado e exibe em alta definição as imagens da câmera de ré. O equipamento também permite conversar por mensagens, escolher rotas e até acessar as playlists favoritas usando a voz. A conexão 4G Wi-Fi nativa permite conectar até sete dispositivos simultaneamente.
A câmera frontal e o conjunto de sensores são a base de uma série de sistemas de segurança. Caso o motorista saia da faixa da pista sem usar a seta, o veículo emite um alerta. O mesmo ocorre quando surgem obstáculos à frente. Se o sistema estimar que a velocidade de aproximação do obstáculo é excessiva e o impacto, iminente, os freios de emergência são acionados independentemente da ação motorista.
Dentro da proposta de oferecer conforto dos SUVs em uma picape, alguns detalhes poderiam ser aprimorados. Plásticos duros poderia dar lugar a material emborrachado. O volante tem regulagem de altura, mas não de profundidade. Um sensor de ponto cego seria bem-vindo.