O ABC registrou no segundo turno da eleições municipais, no último domingo (30), o maior número de abstenções e de votos em branco e nulos desde 1996, quando houve decisão em duas etapas pela primeira vez na região.
De acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) compilados pelo Diário Regional, 40,4% dos eleitores de Santo André, São Bernardo, Diadema e Mauá não votaram ou não escolherem nenhum candidato no segundo turno. Em números absolutos, dos 1.815.438 eleitores aptos a votar no domingo, 733.412 não escolheram um candidato. Em 2012, 28,9% do eleitorado renunciou ao voto nessa fase da disputa.
No corte por cidades, Mauá e São Bernardo registraram os maiores índices de “não voto”, com 42,28% e 41,73% do eleitorado, respectivamente, abrindo mão de escolher um dos candidatos. Em Diadema, brancos, nulos e abstenções alcançaram 40,48% do total de eleitores. Santo André registrou o menor índice (37,92%).
Quando se analisa os dados históricos do ABC é possível observar tendência de aumento do “não voto” no segundo turno das últimas quatro eleições (veja gráfico abaixo). Entre 2000 e 2012, o número de abstenções e de votos nulos e em branco cresceu em média 3,4 pontos porcentuais, mas há um salto de 11,5 pontos na passagem de 2012 para 2016.
Jacqueline Quaresemin, cientista política e professora da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), relata que o número de votos nulos e em branco e de eleitores que se abstêm de votar vem aumentando a cada ano. “Em âmbito nacional, temos um aumento médio de um ponto percentual a cada eleição desde 2008. Esses dados mostram crescente descontentamento (com a política). Cada vez mais, as pessoas não se identificam com quem se propõe a representá-las”, explicou.
A crise que tem afetado o PT, pontua a cientista, tem grande impacto nos números. Centro do escândalo do “petrolão” e das investigações da Operação Lava Jato, o partido foi atingido também pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. “Esse desencantamento com a política é também um desencantamento com o PT, partido que ainda hoje mobiliza muito as pessoas. Quando essa legenda não disputa, muitos eleitores não se sentem motivados a participar da eleição”, afirmou.
Reforma política
Questionada sobre se o alto índice de brancos, nulos e abstenções pode sensibilizar a classe política a promover uma reforma mais profunda no sistema eleitoral, Jacqueline é enfática ao afirmar que não. “Lobo não come lobo. A reforma política depende de os partidos reverem seus tamanhos e processos, mas dificilmente farão isso por iniciativa própria”, afirmou.
“Os dados mostram que essa tendência (de renúncia ao voto) foi desconsiderada pelos partidos e dirigentes políticos, principalmente os de esquerda, que tinham ali seus redutos mais fiéis”, relatou Jacqueline. A cientista política reforça que os resultados das eleições como um todo deverão ser analisados com profundidade na perspectiva de compreender o que o eleitor vem dizendo, para além da constatação de seu desencantamento com a política. “A questão a responder, exatamente, é com o que se desencantou”, finalizou.