LUIZ HUMBERTO MONTEIRO PEREIRA
AutoMotrix
Há automóveis que são feitos apenas para deslocar pessoas entre um lugar e outro. O Mustang não é um desses. Lançado em 1964, o modelo logo se tornou símbolo de esportividade, originando até um gênero de veículos: o “pony car”, cupê esportivo de quatro lugares com capô longo e traseira curta. Em sua sexta geração e quase seis décadas após o lançamento, não para de atrair olhares por onde passa.
A prova de que seu apelo continua forte é o fato de que a geração atual fechou 2020 como o esportivo mais vendido do mundo pelo segundo ano seguido. O Mustang já teve várias versões e edições especiais, como Shelby, Bullitt e a icônica Mach 1, apresentada em 1969 e recriada no ano passado após ter sido oferecida pela última vez em 2004.
Apresentado no Brasil em abril e com as primeiras entregas feitas em junho, o atual Mustang Mach 1 é produzido nos Estados Unidos em edição limitada, mas sem quantidade especificada. Seu preço base é de R$ 523.950, mas no Estado de São Paulo o ICMS diferenciado pode elevar o valor.
Como é tradição nos Mustang, o propulsor do atual Mach 1 é um espetáculo à parte. O conjunto motor-câmbio formado pelo robusto Coyote V8 5.0 e pela transmissão automática de dez velocidades recebeu calibração exclusiva para a versão, com ganho de 17 cavalos. O Mach 1 entrega 483 cv a 7.250 rpm e 56,6 kgfm de torque a 4.900 rpm. Conta com novo conversor de torque para viabilizar trocas mais rápidas. O sistema de indução de ar foi herdado do Mustang Bullitt, enquanto o coletor de admissão, o sistema de arrefecimento do motor e o radiador da transmissão são do Shelby GT350.
Escapamento, difusor traseiro, conjunto de braços e buchas da suspensão e o sistema de arrefecimento do diferencial foram “emprestados” do Shelby GT500. A suspensão adaptativa MagneRide, com fluido eletromagnético viscoso, mereceu calibração exclusiva para elevar o desempenho nas pistas. Todo esse aparato permite que o Mach 1 acelere de zero a 100 km/h em 4,3 segundos e atinja a máxima de 250 km/h, limitada eletronicamente.
Há décadas, o Mustang funciona como uma marca própria dentro da Ford, tanto que é o potro a galope aparece na grade e no volante, nos quais deveria estar o oval azul da marca americana. Estilisticamente, o novo Mach 1 é uma revisão de referências históricas com olhar contemporâneo. A grade abriga dois nichos redondos que evocam os faróis auxiliares do modelo 1969. Uma faixa preta com friso colorido percorre o capô e as laterais, sendo complementados pelo emblema “Mach 1” no para-lama dianteiro. O para-choque tem difusor e duas entradas de ar laterais.
As rodas de 19 polegadas com acabamento cinza brilhante usam pneus 255/40 R19 na dianteira e 275/40 R19 na traseira e explicitam os vistosos freios Brembo – os dianteiros, de 15 polegadas, têm pinças de alumínio, seis pistões de 36 mm e pastilhas desenvolvidas para as competições. Na parte de trás, destacam-se o elegante aerofólio e as quatro ponteiras de escapamento integradas, também originárias do Shelby GT500, além das lanternas unidas por faixa preta que ostenta a assinatura “Mach 1” no centro.
São oito cores disponíveis: Cinza Dover, Branco Ártico, Preto Astúrias, Prata Orvalho, Azul Indianápolis, Laranja Astana, Amarelo Talladega e Vermelho Arizona, esta a do modelo testado.
Há sete modos de direção no Mach 1: Normal, Esportivo, Esportivo+, Pista, Drag, Neve/Molhado e My Mode. Os modos variam os parâmetros de troca de marchas, da resposta do acelerador, da atuação dos freios, do controle de estabilidade, do ajuste da direção, da suspensão adaptativa e até do som do escapamento.
Com tela digital de 12 polegadas, o painel de instrumentos permite personalizar cores e mostradores e dá acesso aos Track Apps, que incluem o marcador de zero a 100 km/h e o Line Lock para arrancadas. A segurança autônoma marca presença no alerta de colisão com detecção de pedestres e frenagem de emergência, no assistente de permanência em faixa e no alerta de fadiga. Entre os equipamentos de segurança convencionais estão oito airbags (frontais, de cortina, joelhos e tórax), controle eletrônico de estabilidade e tração, assistente de partida em rampa, câmera de ré com sensor de estacionamento e monitoramento de pressão dos pneus. Todos os equipamentos são de série e não há opcionais.
Em todos os sentidos
Dirigir o Mustang Mach 1 é uma experiência singular e exige que o motorista se acostume à ideia de ser observado o tempo todo. Em qualquer lugar que apareça, o carro vira o centro das atenções. Sua presença gera reações contrastantes – uma quantidade farta de sorrisos largos de admiração quase infantis em meio a olhares oblíquos, nos quais a inveja beira o estado sólido.
Em tempos nos quais os motores turbinados ou elétricos ganham espaço, o Mustang Mach 1 é um dos derradeiros esportivos a manter um motor V8 aspirado, o que afeta não apenas o desempenho, mas também o comportamento acústico. No caso, um rumor gutural que causa taquicardia nos fãs dos motores V8. O escapamento oferece quatro níveis sonoros. Enquanto o Silencioso pode ser ajustado para não incomodar os vizinhos pela manhã, nos modos Normal, Esportivo e Pista, o som fica gradativamente mais enfurecido.
Experiências sensoriais podem ser interessantes, mas um carro como o Mustang Mach 1 é desenvolvido para ser acelerado com força. Não há vias públicas no Brasil que permitam “soltar a cavalaria” de um modelo como esse em segurança – para quem quiser (e souber fazê-lo), é prudente procurar um autódromo, com generosas áreas de escape e sem outros veículos pelo caminho.
Ao ser pressionado até o fundo, o pedal do acelerador gera impulso instantâneo e impressionante, que afunda as costas dos ocupantes na macia espuma dos bancos. O modelo acelera progressivamente, com o câmbio fazendo as trocas de forma eficiente e sem vacilações – é possível fazê-las manualmente na manopla do câmbio ou nas borboletas no volante. Nos modos Esportivo, Esportivo+ e Pista, as marchas são esticadas para otimizar a entrega de potência e torque.
Se, nas retas, o modelo acelera de forma brutal e devora quilômetros como se fossem metros, nos trechos mais sinuosos o comportamento também impressiona. O conjunto suspensivo bem equacionado dá a sensação de que o veículo anda sobre trilhos. Rígida e de curso curto, como se espera de um esportivo, a suspensão entrega alguns solavancos quando encara pavimentos maltratados. Na melhor tradição dos “muscle cars”, o Mach 1 até pode ser usado cotidianamente por pessoas que não se preocupam demasiadamente com conforto. Quanto ao consumo, quem compra um carro com motor V8 aspirado de 483 cv não deve se preocupar com “detalhes” tão mundanos. Durante o teste, que alternou trechos urbanos e estradas, a média de consumo ficou pouco acima de 6 km/l.
A BORDO
Quando a chave é acionada para abrir a porta do Mach 1, uma luz sai da parte inferior das carenagens dos retrovisores externos e projeta o ícone do cavalo no chão. A cabine em estilo cockpit tem influência aeronáutica: comandos na direção, teclas no painel de instrumentos digital, câmbio e console central são claramente inspirados nos aviões.
A iluminação ambiente pode ser personalizada em sete cores. Os bancos frontais, com revestimento em couro perfurado, têm recortes horizontais e detalhe de cor contrastante no encosto. Os dois lugares traseiros têm acesso um tanto complexo e não são recomendáveis a maiores de 18 anos – compreensível em um esportivo sem pretensão familiar. Detalhes de metal polido e escurecido reforçam a esportividade. A placa afixada no painel com o número de identificação do chassi atesta a exclusividade.
A central multimídia Sync 3 vem com navegação e comando de voz, além de oferecer conexão com Apple CarPlay ou Android Auto. O sistema de áudio premium da Bang & Olufsen tem mil Watts de potência, 12 alto-falantes e esbanja categoria. O novo Mach 1 vem equipado com o FordPass Connect, que dá acesso às informações e aos comandos do veículo pelo celular.