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Apesar da crise causada pela pandemia, inadimplência registra queda no país

Apesar da crise causada pela pandemia, inadimplência registra queda no país
Em julho, 63,5 milhões de brasileiros estavam inadimplentes, segundo pesquisa da Serasa. Foto: Arquivo

A crise econômica provocada pela covid-19 no país elevou o desemprego a níveis recordes e provocou o fechamento de um sem-número de empresas. Porém, ao contrário do que se poderia esperar, os níveis de inadimplência, sejam de pessoas físicas ou jurídicas, recuaram.

Segundo especialistas, esse quadro surpreendente é resultado direto do auxílio emergencial, dos programas de socorro às pequenas e microempresas e também da taxa de juros no piso histórico, o que permitiu forte movimento de renegociação de dívidas por parte dos bancos. No auge da pandemia, as instituições financeiras também permitiram o adiamento de pagamentos por 60 dias.

A grande dúvida é como o calote vai se comportar quando todos esses socorros acabarem e a economia tiver de voltar a andar com as próprias pernas. O temor é que haja explosão da inadimplência no início de 2021.

“A queda da inadimplência é algo inédito”, afirmou o economista Luiz Rabi, da Serasa Experian, empresa que monitora a situação financeira de consumidores e empresas no país. Em julho, último dado disponível, 63,5 milhões de brasileiros estavam inadimplentes, segundo pesquisa da Serasa. São 2,5 milhões de pessoas a menos do que em abril, quando o Brasil parou por causa da covid-19. Também o número de empresas com dívidas em atraso recuou em julho para o menor nível do ano: 5,8 milhões. É exatamente a mesma quantidade de companhias inadimplentes registrada em julho do ano passado.

Outro termômetro do calote é a quantidade de empresas que pediram recuperação judicial, isto é, que reconheceram a incapacidade financeira de pagar as dívidas em dia e solicitaram à Justiça condições especiais. Os dados, coletados em todos os cartórios do país, mostram que neste ano, até agosto, 868 empresas procuraram esse caminho, número 7,3% menor que o registrado no mesmo período de 2019. Para os oito primeiros meses do ano, o número de processos em 2020 foi o menor desde 2015. Pelo ritmo atual, a perspectiva é que 2020 termine com 1,3 mil pedidos. Em 2019, sem pandemia, foram feitos 1.387.

Rabi diz que o risco de o calote voltar a subir está ligado, no primeiro momento, aos consumidores, e depois às empresas. “Os brasileiros que perderam renda estão pendurados hoje no auxílio emergencial, que tem data e hora para acabar (no final de dezembro).” Se, até o final do ano, o quadro for ainda ruim para o emprego, a inadimplência da pessoa física pode subir e resvalar na pessoa jurídica, que não vai receber os créditos em dia. “A inadimplência está represada, não está extinta”, alertou Rabi.

Fabio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), considera que os bancos estão empurrando o problema da inadimplência com a “barriga”. “Deram carência, por isso, o indicador não está saindo do lugar.”

BANCOS

Do início da crise até agosto, os bancos postergaram R$ 110,5 bilhões em dívidas, em um total de 14,2 milhões de contratos, segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban). Desse total, a maior parcela de beneficiados é de pequenas empresas e pessoas físicas, um volume de R$ 62,2 bilhões. Neste mês vence a primeira rodada das carências concedidas, que pode vir acompanhada de aumento da inadimplência, num cenário de desemprego elevado.

A preocupação dos bancos com risco de calote está estampada nos balanços. No segundo trimestre, Bradesco, Itaú Unibanco, Banco do Brasil e Caixa elevaram o gasto com provisões para devedores duvidosos em mais de R$ 14 bilhões, totalizando R$ 193,6 bilhões.

Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos, aposta em pico da inadimplência das famílias já no fim deste ano. Bentes, da CNC, lembra que o auxílio emergencial de R$ 600 foi reduzido pela metade a partir de setembro e questiona se, após o final dessas medidas, a economia terá capacidade de voltar a crescer por conta própria para fazer frente à inadimplência, uma vez que o investimento não foi retomado.

A catadora de artigos para reciclagem Gisele Santos da Silva, 34 anos, casada e mãe de duas filhas, estava inadimplente desde 2012. Na época, trabalhava como auxiliar de limpeza, foi demitida e a empresa, segundo ela, não pagou a rescisão. Resultado: ficou sem renda para quitar a fatura do cartão de crédito e a dívida, como ocorre nesses casos, virou bola de neve.

Em agosto, com juros e multa, a dívida estava em cerca de R$ 700, mas a catadora conseguiu quitar a pendência e deixar a lista de devedores, desembolsando R$ 143. “Foi fácil até demais negociar desta vez, não esperava esse descontão.”

Como catadora, Gisele tira entre R$ 300 e R$ 350 por semana, mas a renda é incerta. Ela está recebendo o auxílio emergencial, que até agosto era de R$ 600 e foi reduzido à metade a partir de setembro. “Com o auxílio estou pagando as despesas. Não sobra nada, ainda mais agora com tudo aumentando.”

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